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O pink money e as empresas de TI

A situação política do nosso país está bem polarizada e, recentemente, os debates cada vez mais intensos.

A população LGBTQ* se deparou nos últimos dias com mais uma polêmica: a cantora Anitta seguiu um perfil de uma amiga que, curiosamente, fazia várias publicações apoiando um certo candidato que adota políticas e discursos contra a população que provavelmente é a maior base de fãs da mesma… os LGBTQ*. Isso, somado com o fato de ter sido a última rainha da Parada Gay de São Paulo, uma das maiores do mundo, e não ter se posicionado pelo menos contra discursos de ódio enquanto várias outras pessoas da própria comunidade ou simpatizantes o fizeram (como foi o caso de Iza, Pabllo Vittar, Daniela Mercury, Glória Groove, etc), fez eclodir uma série de debates e até publicações da própria sobre suas posições políticas e o direito de manter o voto secreto. Bom, a minha opinião, o que é pink money e um pouco mais sobre todo o assunto pode ser visto nesse excelente vídeo do Spartakus Santiago abaixo.

Porém, comecei a pensar mais próxima da minha realidade: há mais de 5 anos eu sou programadora e já trabalhei também com infra e suporte. Já sofri assédio moral e sexual dentro de empresas, já fui inferiorizada por ser mulher, já tive medo de assumir minha orientação sexual dentro de espaços onde trabalhei, etc. Também já vi um novo horror surgindo, e que pretendo falar mais nesse post: a tokenização e a utilização do pink money da pior forma possível.

Recentemente no meio de TI existe uma onda de empresas que estão adotando discursos a favor de subgrupos representados: muitas empresas utilizaram a bandeira do arco-íris, símbolo da nossa luta LGBTQ*, em postagens na época do mês do orgulho LGBTQ*. Na semana da mulher, textos e mais textos e imagens valorizando as profissionais de TI. Tudo muito colorido, lindo e bem editado pelo funcionário do marketing. Empresas e mais empresas querendo que aconteçam cada vez mais meetups de “[Tecnologia]Girls ou [Tecnologia]Women” nas mesmas. Como é bonito mostrar que tá rolando um meetup de diversidade na sua empresa.

Mas o que SUA EMPRESA faz para o ambiente ser confortável para subgrupos representados não só até o processo de recrutamento? Você está atraindo mulheres por serem mulheres, ou está atraindo mulheres porque são pessoas? Estou cansada de ser vista por muitas empresas como um mero número para auxiliar a bater a meta “quanta diversidade temos dentro da empresa x”? “Ah, temos de 60 funcionários umas 20 mulheres… acho que tá bom.”

Isso é só o começo. Precisamos urgente falar de tokenização.

Tokenizar é utilizar uma figura ou algo do subgrupo representado (ou as “minorias”, termo que não acho muito legal usar) como parâmetro para dizer que aquele espaço tem o que você quer. Usar de argumento. “Ah, mas minha empresa é diversa… tem até uma mulher na equipe de programação”.

Não. Ela não é.

De todas as empresas que postam bandeira LGBTQ*, falam da importância de ter mais funcionárias mulheres e funcionários negros e negras… quantas, de fato, têm?

A sua empresa tem mulheres? Legal… é na parte do marketing, recrutamento e servindo cafézinho/limpando banheiro ou existem mulheres na parte técnica também? E os negros? Eles estão só na parte de limpeza e cozinha ou estão codando, fazendo pareamento, ajudando na tomada de decisões? Essas pessoas estão executando cargos de liderança?

Você postou uma fotinho muito linda dizendo no Twitter que sua empresa apoia o mês do Orgulho LGBTQ*. Quantas pessoas LGBTQ* existem na empresa? Se existem, existe também algum comitê da diversidade para, em caso de preconceito, essa pessoa poder se sentir segura onde trabalha? É muito fácil nos socar dentro de uma empresa como se fôssemos números e falar: beleza, quer diversidade? Achou. Se vira!

Justamente porque sabemos que estamos em um mercado que muitas pessoas se recusam a nos encontrar nos corredores. Ainda.

Vocês acham que isso que tô falando é mentira? Procurem participar mais de debates de diversidade e inclusão que têm rolado, por exemplo, pela Great Place To Work. As denúncias que vocês vão ouvir são muito mais cruéis do que vocês podem imaginar.

Precisamos de processos de inclusão. Se diversidade é o quão diverso é o local, inclusão é de fato incluir aquelas pessoas. Incluir na cultura da empresa, no onboarding e falar pra ela: você está segura se acontecer qualquer problema. Se rolar uma piadinha machista ou homofóbica, fale com o comitê tal que faz reuniões todas as terças e denuncie isso.

Chega de passar a mão na cabeça do Fulano de Tal e sua piada babaca só porque ele tem 10 anos de empresa. Existe a autocrítica e todos nós não precisamos ter vergonha de usar. Isso serve também para feedbacks, positivos e construtivos.

Você quer que o grupo de apoio a minas na programação TechGirls (é só um exemplo de nome aleatório) vá para sua empresa dar uma talk? Bacana! Mas quais são as práticas para diversidade que vocês adotam dentro da empresa? Quantas mulheres vocês contrataram no último ano? E depois, o que acontece com essas mulheres? Elas são ouvidas? Qual o plano de carreira? Alguma já virou líder?

Já cansei de descobrir que empresas que nos chamam pra meetups depois tratam de forma cruel amigas minhas, muitas já consagradas dentro do mercado de TI. Tratadas puramente como: você é uma fonte, então vou te sugar o quanto eu puder.

Me desculpe, mas é muito fácil falar de diversidade nas redes sociais e achar “ok” uma pessoa ir para a empresa com uma camiseta de um candidato abertamente homofóbico e racista, e que acha “ok” mulheres ganharem salários menores.

E sabe o porquê disso me assustar e eu não querer isso onde eu trabalho? Porque não se trata de um candidato. É uma ideia. A ideia de que nós: mulheres, LGBTQ*, negros, deficientes, pessoas com problemas psicológicos… nós não deveríamos sequer abrir a boca pelos nossos direitos. Deveríamos apenas aceitar a “maioria”, abaixar a cabeça e trabalhar.

“Tá, eu vou demitir o cara então?” É por isso que precisamos ter um processo de recrutamento coeso. Verificar se aquela pessoa realmente se encaixa na cultura da empresa e no que ela deseja antes de contratá-la. Se você quer uma empresa diversa, vai fazer um recrutamento que tente captar isso, com entrevistas neste foco ou tentar conseguir essas informações na entrevista principal.

Se reaaaaalmente não rolar, lá dentro essa pessoa pode ter uma série de debates com outros grupos para auxiliar. Por isso a necessidade de comitês: apoios femininos, negros, LGBTQ*s e de todo e qualquer grupo que não se adequar no status quo. Sabe por que isso é importante? Porque a gente sabe que ninguém nasce sabendo e a melhor forma de acabar com a propagação de discursos de ódio é a informação, os debates, a educação.

Ninguém tá te pedindo pra você ser de esquerda, direita, centro, diagonal. Sua empresa pode ser um konami code, tô nem aí.

Estamos te pedindo atitudes que não ameacem a nossa existência.

É difícil? Bom, se você realmente quer diversidade, você tem que arcar com isso.

Se você não tá disposto, pare de usar nossos símbolos de luta para pegar nosso dinheiro e enganar nossos irmãos.

Então, acho que antes de sairmos aceitando meetups em empresas ou comprando produtos porque elas “vendem” uma ideia de que são diversas, acho muito importante consultar internamente. Pergunta praquele seu amigo que trabalha num squad se lá tá tudo bem, se as minas e as monas estão sendo bem tratadas e se existem políticas para diversidade e continuação disso depois do onboarding.

É muito fácil posar de diverso. Difícil é nos defender quando o calo aperta.

É por isso que pessoas que não são de “minorias” somem nessas horas: porque é cômodo. Só que para nós, que SOMOS essas “minorias”, não temos opção de fugir, porque é a luta pela nossa existência.

Já trabalhei com e hoje com muuuuito orgulho trabalho em uma empresa onde diversidade não é só discurso, é prática. Tem debate, desconstrução, suporte.

Mas infelizmente, nem tudo são flores e prezo pelas minhas irmãs, irmãos e irmes que ainda não vivem essa realidade. E a luta continua.

Feminismo Reflexões Tecnologia

Cadê as mulheres no meu evento de TI?

Galera, estava eu confabulando e dando uma olhada em alguns eventos de comunidade e fiquei bem chateada com o baixíssimo número de mulheres palestrantes. Toquei sobre esse assunto com as meninas maravilhosas do Django Girls e do Pyladies esse final de semana agora e descobri um bingo da “falta de diversidade de mulheres palestrantes”:

Essa página é ótima e se chama allmalepanels, que retrata eventos e trabalhos que só possuem caras.

A Renata passou outro bingo, mas eu perdi ele e achei esse muito bom também. Para quem não sabe inglês, esse bingo retrata as desculpinhas de não terem mulheres como palestrantes nos eventos de TI.

  • Mulheres não se interessam por esse assunto.
  • Não há mulheres suficientes qualificadas neste assunto.
  • Precisamos de grandes nomes para estas palestras, e poucos são mulheres.
  • Na verdade, é um campo dominado por homens.
  • Não há muitas mulheres nessa posição.
  • As mulheres que chamamos iam estar ocupadas no fim de semana ou cancelaram pouco antes do evento.
  • Mulher não pode ser palestrante porque é conhecida por falar demais.
  • Tentar introduzir mais mulheres como palestrantes é sexista (wtf porém é real).
  • Selecionamos as melhores palestras, e dentre elas não haviam mulheres.
  • Não podemos chutar homens das grades só para colocar mulheres.
  • Não podemos colocar uma mulher onde ela não se encaixa.
  • Mulheres são tímidas.
  • Mulheres na grade? Ninguém pensou nisso antes!
  • Mas as mulheres não submeteram ao evento!!!
  • AH, então me indica você uma mulher aí!
  • Não conheço essa aí.
  • Não tem muitas mulheres pra irem nos eventos.
  • Estamos apenas atendendo a demanda.
  • Mulheres precisam agir mais como homens (kakakakaka)
  • Participantes querem ouvir pessoas parecidas com eles mesmos.

Você já leu essas frases? Já ouviu da boca de alguém? Então, pode apostar, temos algum problema nesse evento.

Gráfico mostra como foi aumentando absurdamente a diferença entre homens e mulheres em posições de tecnologia, como analistas e cientistas

Mulheres por mais que ocupem bem menos os cargos de TI do que homens (por um problema da própria sociedade e da propaganda massiva que separou mulheres da tecnologia na época do boom dos computadores pessoais, por volta de 80), existem mulheres! Muitas! Elas lotam eventos como: DjangoGirls, NodeGirls, Women Techmakers, WomakersCode Summit, Pyladies, AfroPython, RailsGirls! Existe um site só com eventos de inclusão, que é o CODAMOS.

Tá, olha essas fotos! Cheias de mulheres! Muitas! Cadê elas no meu evento?

As mulheres vão em eventos que representam elas. Se as mulheres não se enxergam naqueles eventos, elas simplesmente não aparecem. Foi o caso do Node POA, em que o Henrique Schreiner fez esse contestamento para mim logo após eu ter sido a primeira mulher a palestrar em um meetup de um evento que já ocorria há quase dois anos.

Depois de quase dois anos, eu era a PRIMEIRA mulher a palestrar. Como vamos nos sentir confortáveis num espaço cheio de homens? Foi aí que surgiu a necessidade de um processo de inclusão, que virou algo muito maior. Virou o NodeGirls.

Nossa, mas a gente não morde!

VOCÊ pode ser um cara legal. Mas muitos, muitos não são. TODAS as mulheres já passaram por situações de machismo. Desde piadinhas idiotas e cantadas imbecis na rua até, infelizmente, situações muito mais graves. Contando um pouco da minha carreira, por exemplo, ouvi muito em um dos meus trabalhos que TI não era para mulheres, e que “mulheres são de Humanas, mais delicadas, e que foram feitas para trabalhos menos racionais”. Ouvi coisas ainda piores: que mulheres eram contratadas porque rivalizavam entre si, e isso rendia maior produtividade. Muito pelo contrário! Aquelas brigas provocadas geravam guerras de ego horríveis e o ambiente se tornava cada vez mais péssimo, quando todas nós podíamos ser irmãs se ajudando. Era a rivalização feminina, produto do patriarcado, sendo alimentado como o monstro que é.

Para melhorar a situação, neste mesmo trabalho fui poucos meses depois assediada sexualmente. Um dia após o assédio, a pessoa que me assediou disse que “agiu propositalmente como um psicopata”. Outro dia se foi e a mesma disse que “não foi nada demais”. Isso, sem contar o quesito pessoal, onde já sofri todo tipo de abuso, seja sexual, psicológico, o que fosse.

Sabe qual a pior coisa desse quadro? É que muito provavelmente eu não sou a única mulher em TI que passa por essa situação. Várias mulheres, dentro do fishbowl do NodeGirls, por exemplo, fazem denúncias de não serem contratadas por serem mulheres, por terem “maridos que podem sustentá-las”, denúncias de professores babacas que destroem carreiras e fazem mudá-las de curso ou abandonar a faculdade, etc. Sem contar os casos muito mais graves.

E quando vamos pensar em interseccionalidade? Vários casos de racismo, LGBTQfobia e discriminação por classes sociais. É como se fosse mais do que uma opressão: fosse uma casta, e fôssemos sujeitas a isso eternamente.

Sou mulher. Cresci na periferia paulista. Oriunda do movimento punk. Sou bissexual. A opressão vai muito além de ser mulher ou não.

Uma mulher vai em um evento e só vê homens. Nenhuma mulher para ajudá-la ou lhe passar segurança. Por mais que sejam caras legais, ela não sabe disso. E isso vai remetendo-a a uma série de situações desconfortáveis de um passado (ou presente) de situações de sexismo. Ela não quer estar naquele lugar.

Pense na seguinte situação: uma mulher está sozinha na rua e são dez horas da noite. Existem vários caras andando na rua. Todos eles são gente boa. Mas você pode ter CERTEZA que NENHUMA mulher vai ficar confortável naquela situação. O mesmo ocorre em eventos com falta de representatividade.

Se você um dia já se viu falando alguma das coisas do bingo ou dos tópicos, vale a atenção. E mais:

  1. O seu evento possui na organização alguma mulher?
  2. Você pensa na cota de 50/50 de palestrantes homens e mulheres? Busca aplicá-la?
  3. Como está o código de conduta desse evento? Existe? Ele pensa em mulheres cis, trans, na comunidade LGBT como um todo, na questão racial? Vai ter gente para ajudar em situação de perigo de participantes? E melhor ainda: existem pessoas que VÃO perceber quando um participante está em perigo ou não?
  4. Quais são as iniciativas de diversidade da sua comunidade TI? Simplesmente esperar que um call4papers com uma mulher caia do céu?
  5. Tem muito mais homens do que mulheres? O que você busca fazer para mudar esse cenário? Você está fazendo alguma coisa?

Sobre patrocinadores:

  1. Estes patrocinadores possuem programas de inclusão e diversidade? Lembrando que INCLUSÃO e DIVERSIDADE são coisas diferentes.
  2. Eles possuem histórico ruim sobre diversidade e inclusão? Se sim, se redimiram e estão tentando mudar esse aspecto? Afinal, ninguém nasceu “feminista”, mas nunca é tarde para se redimir e mudar.

Diversidade é o que já existe na empresa. Se ela já é mista, com diferentes tipos de pessoas. A inclusão é incluir mais pessoas diversas :)

Tá, mas afinal, pra quê mulheres na organização e não só como palestrantes? Para elas saberem as situações de machismo e alertarem na organização. Poderem fazer algo voltado para o conforto de mulheres. Para fazerem valer o código de conduta. Existem caras legais, mas eles foram criados na sociedade patriarcal e eles não sabem tudo sobre o que é ou não machismo, porque ainda são machistas em algum ponto. Então, quem vai fazer essa observação em um desrespeito do código de conduta ou até em uma reunião sobre como tocar o evento vai ser uma mulher. E essa mulher precisa ter voz. Não adianta colocá-la para dizer “olhe como meu evento é diverso, temos até mulheres”. Não somos feitas para vitrine de ninguém. O papel dela é mudar a vida de outras mulheres.

E se eu não encontrar mulheres para tocar isso comigo? Nossa rede é enorme. Acho difícil. Mas… fale com outras. Se elas não toparem, peça indicações. Fale até comigo, sei lá! A gente, quando o assunto é ajudar mulher, sempre pensa numa forma de ajudar. Às vezes não dá para estar 100% numa organização de um evento, mas uma call com dicas para tornar o evento mais inclusivo + um acompanhamento já ajuda bastante. É o que eu já fiz por exemplo e deu um resultado bacana em um evento aqui do sul.

Pensem em mulheres. Somos uma realidade. E vamos tomar cada vez mais espaços, pois não aceitamos mais sermos silenciadas. Não buscamos supremacia, apenas não queremos mais ser caladas.

Você gostou? Bacana! Você é nosso aliado!

Você não gostou?

Bom, eu sinto muito. Você terá que mudar, ou será engolido.

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A saga de Porto Alegre

Porto Alegre <3

Vocês já devem ter reparado que eu sumi uns mil meses e quando apareci tô fazendo vários posts e tô de layout novo e lindo, né? Pois bem, tô administrando melhor o meu tempo, tava com saudade de blogar e tô desapegando desse negócio de ter que visitar mil blogs e ficar famo$a. O lance é blogar pra si e pra quem gosta do seu blog, né verdade? Além disso estou bem empolgada de estar participando do Rotaroots. Acho que finalmente não vou ficar naquela vibe de “nossa, não sei o que postar”.

Bom, todo mundo que me acompanha deve ter ficado meio em choque comigo do nada em Porto Alegre. Nesse post eu pretendo dar uma resumidona na história e falar alguns perrengues loucos que eu passei.

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